- Tribunais ampliam proteção a mulheres ao julgar casos de violência doméstica e feminicídio
Agência CNJ de Notícias
Os tribunais de Justiça brasileiros julgaram, até outubro de 2024, 571.340 processos sobre violência doméstica distribuídos até dezembro de 2022. Quanto a feminicídios, foram julgados 6.328 que chegaram à Justiça no mesmo período e aguardavam sentença. A prioridade no julgamento dessas ações judiciais é o alvo da Meta Nacional do Poder Judiciário 8, que busca dar uma resposta às vítimas e, também, ao apelo social pela justiça na defesa da mulher.
A Meta 8 também foi assumida, em 2024, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que se comprometeu a julgar 665 processos de violência doméstica e 246 casos de feminicídio em tramitação na corte superior. Quase todos já foram analisados até outubro de 2024: o balanço mais recente mostra que 630 agressões em ambiente familiar foram julgadas e 232 casos de feminicídios foram analisados.
As Metas Nacionais do Poder Judiciário representam o compromisso de juízes e juízas em atuar de forma sistemática sobre o acervo processual da Justiça e a respeito de temas prioritários, como é o combate à violência doméstica. Elas são aprovadas anualmente no Encontro Nacional do Poder Judiciário, organizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). As Metas Nacionais de 2025 serão decididas nos dias 2 e 3 de dezembro, em Campo Grande (MS).
Aprovada pela primeira vez em 2017, a meta de atuar para fazer valer a Lei Maria da Penha foi assumida primeiro pela Justiça Estadual. Naquele ano, os tribunais buscaram fortalecer a rede de enfrentamento à violência doméstica e familiar contra as mulheres, entendida como a atuação articulada entre as instituições públicas e privadas e a comunidade, para a responsabilização dos agressores e a assistência qualificada às mulheres em situação de violência.
O coordenador do Departamento de Gestão Estratégica do CNJ e juiz auxiliar da Presidência, Fábio de Oliveira, reforça que os casos de violência contra a mulher congregam um conjunto de fenômenos sociais, como o abrigamento, as parcerias para emprego e o apoio psicológico demandado, que extrapolam a análise da violência em si. “Essas questões também são consideradas para o julgamento, que não se resumem a uma questão processual, mas impactam no tempo de duração e gestão dos processos”, diz.
A partir de 2019, a meta passou a ser processual. O estoque de processos era de quase 662 mil casos de violência doméstica até 2018: 247.116 processos foram julgados. Já os casos de feminicídio eram mais de 4,3 mil processos. A meta era julgar pelo menos a metade desse estoque, o que foi superado, com o julgamento de 2.373 ações até o final de 2019.
Em 2024, a Meta Nacional 8 prevê que a Justiça Estadual julgue 75% dos casos de feminicídio distribuídos até dezembro de 2022. Esse percentual corresponde a 6.154 processos. Quanto à violência doméstica e familiar contra a mulher, o alvo é julgar 90% do total de processos distribuídos até 2022, o que representa um volume de 618.084 processos.
Ação articulada
Seis tribunais de Justiça alcançaram, já em outubro, a meta de julgamento de processos de violência doméstica e de feminicídio, com percentuais acima de 100%. Entre eles, está o Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO). Mais de 75% dos casos de feminicídio distribuídos até 31 de dezembro de 2022 já foram analisados e mais de 90% dos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher distribuídos até a mesma data já foram julgados.
Um importante impulsionador desses processos são as Semanas Justiça Pela Paz em Casa. O esforço concentrado coordenado pelo CNJ é realizado três vezes por ano em todos os tribunais estaduais e tem a missão de ampliar a efetividade da Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/2006). “Para essas realizações, há o apoio do Sistema de Justiça, especialmente do Ministério Público, não apenas para as questões processuais, mas em todas as iniciativas de enfrentamento à violência contra a mulher”, afirmou o desembargador do TJRO Álvaro Kalix Ferro, que supervisiona as Metas e os requisitos do Prêmio CNJ de Qualidade no tribunal rondoniense.
Adicionalmente à meta nacional, o TJRO se propôs a atender os pedidos de medidas protetivas de urgência antes do prazo previsto de 48 horas, para garantir a proteção efetiva das vítimas. Também estão sendo desenvolvidos projetos em parceria com outras instituições, como a Polícia Militar e a Polícia Civil do estado.
Autor e coordenador do projeto “Maria Urgente”, vencedor do Prêmio Viviane do Amaral/CNJ, na categoria Magistrado, em 2024; e do projeto “Maria no Distrito”, vencedor em 2023 na categoria Tribunais, Álvaro Ferro destacou que o Rondônia está entre os dez piores estados no ranking da violência contra a mulher, e, por isso, o trabalho integrado do poder público é fundamental.
“Nos mutirões processuais, há uma força tarefa que evidencia o cuidado dos tribunais com essa matéria, incluindo a atenção do próprio CNJ”, registra. “Cada um faz sua parte, mas é preciso estar concatenado a outros serviços, fortalecendo a rede. Essa proteção é um papel de todas as instituições”.
Resposta à sociedade
A mesma posição, de fortalecimento da rede, foi afirmada pelo superintendente-adjunto da Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (COMSIV/TJMG), juiz Leonardo Guimarães Moreira. “Precisamos ampliar o conhecimento sobre a violência. O trabalho deve ser integrado à rede para prevenção e repressão. Esse trabalho é uma resposta à sociedade”, afirma.
Ele acrescenta que, além da condenação penal, é preciso ter ressignificação cultural, que é o alvo dos grupos reflexivos com os homens apenados. Também na linha de abordar o público masculino, o TJMG realiza palestras em parceria com o Serviço Social da Indústria da Construção Civil (Seconci-MG) em canteiros de obras, como parte da Semana da Justiça pela Paz em Casa. “Fazemos uma parceria pedagógica com as construtoras, voltada para a prevenção”, destacou Leonardo Moreira.
Até outubro deste ano, o TJMG havia cumprido 95,94% da meta de julgamento dos casos de violência doméstica. Quanto aos casos de feminicídio, o percentual de cumprimento atingiu 117,50% no mês passado.
Para reforçar a rede de proteção, a COMSIV tem vários projetos na temática, como o “Justiça em Rede”, junto com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/MG), a Polícia Civil e Militar, o Ministério Público e as Secretarias de Defesa Social e Segurança Pública. Além disso, há uma rede de defesa e proteção e a formação de grupos reflexivos em todas as comarcas. Juízes e juízas que atuam no tribunal mineiro também participam do “Justiça vai à escola”, que leva o tema “Chega de violência doméstica” a alunos e alunas das escolas de Minas Gerais.
Perspectiva de gênero
Nos segmentos de Justiça que não julgam esse tipo de casos, o protocolo para julgamento com perspectiva de gênero tem sido adotado, o que demonstra que as políticas relacionadas ao combate à violência contra a mulher vêm se consolidando no Poder Judiciário. “O Poder Judiciário tem tido um papel relevante no impulsionamento das políticas de combate à violência de gênero, que tem repercutido no poder público”, avalia o coordenador do DGE/CNJ, juiz Fábio Oliveira.
Na Justiça Militar, por exemplo, o protocolo tem sido aplicado em diferentes processos, inclusive em matéria administrativa, como concessão de licença-maternidade, benefício previdenciário e em casos de assédio moral.
Para identificar a meta relacionada ao combate à violência doméstica, o CNJ lançou em setembro o ícone da palma da mão de uma mulher em um gesto de combate à violência. A imagem também está associada à campanha Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica. A ação consiste na mobilização de estabelecimentos comerciais e outros locais de acesso público para socorrer mulheres que denunciem ser vítima de violência por meio de um desenho de um X na palma da mão ou outro material em pedido de ajuda.